domingo, 9 de maio de 2010

Novo código de ética médica


Após 20 anos, entra em vigor o novo Código de Ética Médica


Por: Fernando Pedro, Franciane Camila Aparecida, Julia Gracielle e Mônica Santos

Interior de grande hospital da capital mineira

No último dia 13 de abril entrou em vigor o sexto Código de Ética Médica reconhecido no Brasil. Após 20 anos, o antigo código foi finalmente revisado. Os principais destaques do novo código são: O aumento da autonomia do paciente sobre o tratamento a ser adotado, novas regras para reprodução assistida e punição para a emissão de receitas médicas e atestados de comparecimento com letra inlegível. Alguns outros itens importantes também foram revistos. Esses referem-se à publicidade médica, ao conflito de interesses, à segunda opinião, à responsabilidade médica, ao uso do placebo e à interação dos profissionais com planos de financiamento, cartões de descontos ou consórcios.
Os trabalhos de revisão duraram dois anos, e foram coordenados pela Comissão Nacional de Revisão do Código de Ética Médica. O objetivo do novo código é atualizar a prática da medicina aos avanços tecnológicos e científicos, à autonomia e ao esclarecimento do paciente, além de reconhecer claramente o processo de terminalidade da vida humana. Foram analisados os códigos de ética médica de outros países, sendo considerados elementos de jurisprudência, posicionamentos que já integram pareceres, decisões e resoluções da Justiça..
A autonomia do paciente é um dos itens de maior destaque. O documento diz que o médico deverá aceitar as escolhas de seus pacientes, desde que adequadas ao caso e cientificamente reconhecidas. O novo Código reforça o caráter anti-ético da distanásia, entendida como o prolongamento artificial do processo de morte, com sofrimento do doente, sem perspectiva de cura ou melhora. A esses pacientes devem ser oferecidos todos as opções de tratamentos paliativos disponíveis, devendo a escolha dele sempre ser levada em consideração.
A questão da ortotanásia é certamente uma das mais polêmicas desse novo código. Aqueles pacientes que não tem a perspectiva de cura não devem passar por tratamentos considerados desnecessários. Mas deixar de manter vivo um paciente mesmo em estágio terminal não seria crime? A resposta é não. Pelo menos na opinião de Edgard Audomar Marx Neto,
Professor de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais. Ele explica que: “Não há a configuração de crime. Não se causa a morte de alguém, não se auxilia à prática do suicídio ou mesmo se omitem cuidados. São casos de pacientes terminais, sem comprovada chance de cura, que deixam de ser submetidos a tratamentos inúteis e por vezes dolorosos, e passam a receber cuidados paliativos, ou seja, tratamentos contra a dor e o sofrimento.”
O professor chama à atenção para a necessidade de se comprovar que o paciente em questão realmente está em estado terminal, pois, a situação muda completamente de figura quando existe alguma possibilidade de cura, mesmo o caso sendo grave. “se o paciente não é terminal, se há possibilidade de cura ou se a conduta significar abreviação da vida, aí sim há crime”. Explica ele.
Apesar de apresentar mudanças significativas, o novo código parece ser bem aceito pelos médicos. Eles não entendem que as mudanças irão interferir no exercício da medicina. “Na verdade o novo código não tem como objetivo interferir no trabalho dos médicos e sim atualizar conceitos, revendo direitos e obrigações frente à realidade da medicina no mundo contemporâneo”, é o que afirma Professor de Ética e Direito Médico das Faculdades de Medicina e Direito da UFMG, Geraldo Luiz Guedes. Ele ainda entende que as responsabilidades dos médicos frente aos seus pacientes já eram muito bem definidas no código anterior, e o que de fato modificou foi à inclusão de novos atores.
Outro ponto que causa polêmica no novo código é o da reprodução humana assistida. Antes, esse processo era regido apenas por normas sanitárias. Agora, outras regras foram aplicadas a prática da fecundação artificial, com destaque para a que proíbe a escolha do sexo do bebê e para a obrigação do profissional responsável pela reprodução de trabalhar com um número limitado de embriões, a fim de evitar a gestação de vários bebês.
Ainda foram diretamente afetadas pelo código áreas da medicina como a estética e a cirurgia plástica. Os médicos só podem receitar depois de ver o paciente, não podendo atuar em centros de beleza que vendem produtos. Fica proibido também o diagnostico por intermédio de veículos de comunicação. O novo código de ética médica já está em vigor, contando ao todo com 118 normas de condutas.

Conselhos Regionais, irão fiscalizar, mas, orientam pouco seus afiliados

Santa Casa de Belo Horizonte


Os Conselhos Regionais de Medicina(CRM) são os responsáveis pela fiscalização do cumprimento do novo código. Eles são dotados de estruturas administrativas, com delegacias presentes em suas principais cidades e departamentos de fiscalização, além das Comissões de Ética existentes em todos os hospitais. Segundo o Professor de Ética e Direito Médico nas Faculdades de Medicina e Direito da UFMG, Geraldo Luiz Guedes, outras entidades também podem ajudar na fiscalização. “Outras instâncias do poder público também desempenham papel fiscalizador e devem ser acionadas sempre que necessário”, afirma ele.
Os Conselhos Regionais de Medicina estão presentes em todas as unidades da federação. Ainda assim, o Professor Geraldo Luiz Guedes acredita que os agentes fiscalizadores são insuficientes, destacando ainda a importância do conhecimento do código pela população: “É claro que por melhor que sejam as estruturas fiscalizadoras elas sempre serão insuficientes, portanto é fundamental que o novo código venha ser mais amplamente conhecido e o exercício da cidadania se faça tanto pelos pacientes como por qualquer cidadão sintonizado e preocupado com a boa prática médica”, diz o Professor.
Apesar de possuírem boas estruturas, inclusive de comunicação, tanto os Conselho Federal de Medicina, quanto os Conselhos Regionais de Medicina tem pecado na divulgação do novo código entre os médicos afiliados a eles. O médico gastroenterologista Fernando Pizzamaglio diz que não recebeu nenhum comunicado da criação do novo código, nem do Conselho Federal nem do Conselho Regional de Minas Gerais. Ele ficou sabendo da implantação das novas regras através de um programa de televisão.
Outros conselhos de profissionais ligados a área da saúde também não comunicaram aos seus membros da existência do novo pacote de regras. Edna Maria que é responsável pela equipe de enfermagem da Endoscopia Clínica e Cirúrgica relatou não ter recebido nenhum comunicado sobre o assunto do Conselho Regional de Enfermagem do Minas Gerais(Coren-MG). Ela também tomou conhecimento das mudanças através da imprensa.

Letras inlegíveis com os dias contados

As letras inlegíveis são uma grande barreira entre médicos, pacientes e farmácias. Os populares “garranchos” estão na mira do novo código. Letras que são impossíveis de serem decifradas podem até prejudicar o tratamento, pois, podem provocar a impossibilidade de compra de medicamentos e até mesmo a compra de um produto incorreto. A orientação para que os médicos escrevam seus receituários de forma legível já constava no código de 1988. Entretanto, o número de reclamações era tão grande, que o item teve que ser reforçado no novo conjunto de normas.
A letra inlegível realmente prejudica os pacientes, nesse ponto até os próprios médicos concordam.”Conheço casos em que a receita foi emitida de forma inlegível e a compra do medicamento não foi realizada pelo paciente”. Esse é o depoimento do médico gastroenterologista Fernando Pizzamiglio. Ele ainda disse que não passa por esse problema, pois emite todas as suas receitas através do uso de computadores.
Uma das explicações dos médicos para não adotar meio eletrônicos para a emissão de receitas, é a questão financeira. O baixo valor das consultas inviabilizam a informatização dos consultórios. A Coordenadora do Laboratório São Marcos, Shirley Jesus Bicalho confirma essa informação: “O que os médicos mais alegam é que vai gerar gastos. Terão que comprar que comprar um computador, uma impressora, sendo que a consulta custa 50 reais. Para informatizar os consultórios, eles teriam que agregar valor nessas consultas”. Ela disse eperar por essa informatização dos consultórios, já que a letra inlegível em receitas e atestados médicos agora é passível de punição.

Médico é obrigado a denunciar a violência doméstica
Hospital de Pronto Socorro João XXIII

O novo código traz novas regras sobre o exercício da medicina, reformula as antigas e atualiza o trabalho do médico diante das inovações tecnológicas. Mas, não é só isso. Uma norma também tem um cunho social. O profissional agora é obrigado a informar as autoridades qualquer suspeita de ferimento oriundo de tortura, inclusive quando provenientes de violência doméstica.
Esse artigo fazia-se muito necessário, já que a Organização das Nações Unidas(ONU) divulgou em Março de 2010 um dado muito preocupante. Segundo a entidade, cinco mil mulheres morrem todos os anos vítimas da própria família. O grande problema é que muitas das pessoas que sofrem esse tipo de ataque tem medo de denunciar, pois, temem sofrer retaliações se levarem o caso as autoridades. A Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Navi Pillay acredita ainda, que uma em cada três mulheres já sofreu algum tipo de violência doméstica.
O Brasil até tem legislação especifica para esse tipo de violência, o que dificulta o trabalho das autoridades é a falta da denuncia. Como grande parte das pessoas violentadas tem que passar por atendimento médico, essa obrigação da informar os casos suspeitos de violência familiar ajudará no combate desse grande problema social. Mas é claro que para ser eficiente, o item tem que ser seguido a risca pelos profissionais da medicina.
Segundo a coordenadora do Laboratório São Marcos, Shirley Jesus Bicalho essa obrigação de denúncia da violência doméstica já existia por lei aos enfermeiros(as) que participam dos atendimentos. Esse já eram obrigados a comunicar qualquer caso suspeito ao Serviço de Assistência Social, para que as medidas investigativas, e se for o caso, punitivas sejam tomadas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário